Por que Formula 1 baniu os melhores carros

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Por que razão a Fórmula 1 baniu os melhores carros?

Embraiagem automática, sensores baseados em telemetria, acelerador drive by wire, válvulas pneumáticas, direção assistida selecionável pelo piloto, diversos computadores instalados a bordo… A intenção da Williams era clara: fazer com que o FW15C de 1993 fosse mais rápido do que a concorrência.

Todas essas características técnicas, que, hoje, são consideradas banais na Fórmula 1, há três décadas, com as corridas a realizarem-se de forma “maioritariamente analógica”, permitiu à Williams elevar a fasquia na prova rainha do desporto automóvel, ao utilizar engenharia proveniente da NASA.

Para se ter uma ideia da superioridade da Williams, basta referir que, em 1993, a equipa liderada por Frank Williams conquistou o título de construtores com quase o dobro dos pontos da McLaren, tendo ficado em terceiro lugar a Benetton e, no quarto posto, a Ferrari.

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Em 1994, a FIA baniu da Fórmula 1 as melhores inovações da Williams, casos dos travões analógicos, do controlo de tração e da suspensão ativa. A FIA parecia estar com “medo” dos engenheiros da Williams. Tanto mais, que até a transmissão de variação contínua foi banida após ter sido testada, nunca tendo, inclusivamente, participado numa corrida.

Ajudas eletrónicas

O que tornou, então, as inovações da Williams tão significativas? É que cada uma permitiu resolver um problema específico que as equipas de Fórmula 1 enfrentavam. Sabendo-se que os pilotos não são todos iguais e que cada segundo de falta de concentração se paga caro…

Os dispositivos ABS e controlo de tração vieram facilitar bastante a tarefa dos pilotos. Tal como nos automóveis de produção em série da atualidade, o Williams FW15C dispunha de sensores de velocidade e computadores que detetavam se uma roda parava de girar quando o monolugar se deslocava para a frente.

Tal acontecia quando o piloto avaliava mal as condições de aderência ou a velocidade de passagem em curva, aplicando força excessiva sobre o pedal do travão. Neste caso, o computador do ABS intervém e reduz a potência total de travagem, através do “pulsar” ou da aplicação intermitente de travões.

Reduzir a potência total de travagem fazia com que as rodas voltassem a girar, permitindo ganhar tração e atuar sobre a direção para manter a trajetória. Sem ABS, as rodas bloqueavam e o monolugar seguia em frente sem obedecer à direção, por mais que o piloto atuasse sobre o volante.

O controlo de tração funcionava de acordo com o mesmo princípio. Utilizava sensores de velocidade e computadores para detetar se uma das rodas girava mais depressa do que as restantes. Tal acontecia quando o piloto avaliava mal a situação e utilizava demasiado o pedal do acelerador.

Nos monolugares de tração traseira, como os da Fórmula 1, se os pneus traseiros rodarem depressa demais, ficam com menor tração do que os dianteiros, o que pode levar a uma sobreviragem e a um consequente peão. O controlo de tração reduz a aceleração e permite manter a trajetória do monolugar.

O ABS e o controlo de tração permitiam aos pilotos da Williams colocar os seus limites mais longe, arriscando mais com maior margem de erro, nomeadamente em superfícies escorregadias, relva e corretores, o que lhes conferia clara vantagem face à concorrência.

Suspensão ativa

A FIA parecia não ter adorado tais inovações, que permitiriam aos pilotos com menos sucesso ganharem corridas, ficando a condução “entregue” à tecnologia. Mais: talvez a FIA defendesse mesmo que devessem ser os melhores pilotos a ganhar as corridas e não os melhores engenheiros e programadores.

Nesse sentido, em 1994 a FIA baniu todas e quaisquer ajudas eletrónicas. Mas o sucesso do Williams FW15C deveu-se, essencialmente, a outra solução: suspensão ativa controlada por computador.

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Enquanto uma suspensão passiva utiliza molas mecânicas e amortecedores pressurizados com a mesma taxa de compressão, mantendo a mesma altura ao solo em todas as situações de condução.

Devido à ampla variedade de velocidades, curvas e superfícies durantes os Grandes Prémios, a suspensão passiva é sempre uma solução de compromisso. Já a suspensão ativa controlada por computador, deteta irregularidades, oscilações da carroçaria e vibrações, ajustando o amortecimento às condições do momento.

A Lotus foi a primeira a experimentar a suspensão ativa com a adição de componentes no topo das molas e amortecedores. Mas a adição de peso trazida pela componente hidráulica, atuadores mecânicos, computadores e sensores, fez com que a equipa abandonasse rapidamente esta solução.

Ao invés, a Williams manteve-se firme na sua ideia e a suspensão ativa controlada por computador substitui mesmo as molas e os amortecedores tradicionais com cilindros hidropneumáticos ativos que pesavam praticamente o mesmo.

Ter um cilindro separado em cada canto do monolugar permitia aos pilotos manter o controlo do carro em circunstâncias que iriam “incomodar” a suspensão passiva. Tal deve-se ao facto de cada roda poder ser ajustada de forma independente das restantes.

Por exemplo, se o monolugar passasse por cima de um corretor com as rodas do lado direito, a suspensão tornaria o amortecimento mais firme desse lado de modo a reduzir o rolamento da carroçaria, ficando as rodas do lado esquerdo com um amortecimento mais brando para absorver os impactos e manter a aderência.

Também a suspensão ativa foi banida da Fórmula 1 pela FIA em 1994. Teria sido por tratar-se de mais um dispositivo de assistência à condução, tal como o ABS e o controlo de tração? A resposta é simples: não.

Questões aerodinâmicas

A suspensão ativa foi banida da Fórmula por violar uma regra de 1969, que proibia partes aerodinâmicas móveis: “Qualquer parte específica do carro que influencie o seu desempenho aerodinâmico deve permanecer imóvel em relação à parte suspensa do carro”, mencionava.

Desde então, foram feitas, na altura, como hoje, várias tentativas para contornar esta questão, com partes aerodinâmicas que reagem de forma diferente em condições distintas.

Atualmente, a única parte móvel aerodinâmica aprovada para utilizar na Fórmula 1 é a DRS, sistema que “abre” a asa traseira para ganhar velocidade. O Williams FW15C não dispunha de qualquer parte móvel aerodinâmica. O que tinha era uma função “push to pass”, que criava um efeito semelhante à DRS de hoje.

A velocidades elevadas em linha reta, o piloto podia premir um botão no volante que rebaixava a suspensão traseira. O que permitia ajustar a altura de todo o monolugar, tornando o ângulo da asa traseira mais direito, reduzindo, assim, a resistência aerodinâmica para ganhar aceleração e velocidade.

O botão do volante encontrava-se ligado a uma unidade eletrónica de comando (ECU) que estendia, temporariamente, o regime máximo do motor em 300 rpm. A redução da resistência aerodinâmica e o regime superior do motor permitiram ao Williams FW15C superiorizar-se à concorrência.

Como esta solução funciona através da alteração do perfil aerodinâmico do monolugar da Williams, a FIA baniu-a utilizando essa justificação. E quanto à transmissão de variação contínua (CVT)?

Transmissão de variação contínua

Tratava-se de uma evolução tão considerável que a FIA decidiu bani-la antes mesmo de ela ser utilizada num Grande Prémio. A que a tornava tão especial? O número infinito de relações, que permitia usufruir da potência máxima do motor sem haver atrasos na entrega de potência.

Em vez de utilizar carretos metálicos de diferentes tamanhos para criar um número pequeno de relações fixas, a transmissão de variação contínua transferia a potência do motor às rodas através de uma correia e duas polias. Cada uma é concebida a partir de dois cones que se movem próximos ou distantes entre si, de modo a fazer diminuir ou aumentar o diâmetro da correia.

A diferença entre o diâmetro efetivo de cada polia determinava a relação da velocidade do motor para a velocidade da roda. Uma vez que esta podia variar infinitamente entre os valores mínimo e máximo das polias, tal significava que a velocidade da roda podia aumentar ou diminuir enquanto a velocidade do motor se mantinha constante.

Os pilotos do Williams FW15C com transmissão CVT não tinham de sacrificar a potência do motor através da seleção de um conjunto de velocidades. Ou seja, como não tinham de efetuar passagens de caixa, usufruíam melhor da potência do motor. Logo, não havia atrasos na entrega de potência.

A Williams só teve oportunidade de testar a transmissão CVT por duas vezes antes da FIA criar a regra que determinava que os monolugares tinham de utilizar um número fixo de relações de caixa.

Será que a transmissão de variação contínua iria aumentar bastante os custos junto das equipas que tivessem de desenvolver a mesma solução? Ou passariam os monolugares da Williams a ganhar alguns segundos por volta face aos concorrentes que não dispunham de tal tecnologia?

Terão as soluções banidas pela FIA afetado o desempenho da Williams na Fórmula 1? Não necessariamente. A equipa continuou a construir monolugares de elevado gabarito, tendo ganho por nove vezes o Mundial de Construtores (não houve melhor registo alcançado no final dos anos 90).

Conseguirá a Williams recuperar o sucesso de outrora, numa altura em que a FIA estabeleceu um teto máximo de investimento de modo a haver maior competitividade e evitar que equipas mais abastadas ganhem vantagem sobre as que têm um orçamento mais limitado?

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