O aumento verificado no preço dos automóveis novos a nível mundial, no último ano e meio, deveu-se, em parte, à escassez de microchips a uma escala global. Mas existiram outras razões…
Os veículos, hoje, podem incorporar até 150 microprocessadores que controlam tudo, desde as variações de fase do motor até à atuação da direção curva a curva. Uma estranha combinação de acontecimentos fez com que a indústria automóvel perdesse grande parte da sua oferta de microchipsno início de 2020.
À medida que a pandemia de covid-19 impôs restrições de circulação, a procura por carros novos caiu. Os fabricantes reduziram os seus planos de produção e os requisitos de novos microchips diminuiu.
Mas as fábricas desses componentes não abrandaram o seu ritmo. Os consumidores, muitos a trabalhar e a frequentar a escola pela primeira vez ao mesmo tempo para dar apoio aos filhos, começaram a adquirir mais eletrónica.
Quando a disponibilidade das vacinas contra a covid-19 começou a diminuir os confinamentos, os fabricantes tentaram aumentar os seus pedidos de microchips. Mas as fábricas de componentes estavam demasiado ocupadas para dar-lhes a resposta desejada.
Construir novas fábricas de microchips é um processo moroso. O que deixou os fabricantes de automóveis incapazes de produzir carros com a rapidez suficiente para dar resposta à procura, o que fez com que os preços atingissem níveis recorde.
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Gastos dos consumidores diminuem
Assim como uma combinação de forças desencadeou o problema, outra combinação de forças está a começar a aliviá-lo. Ironicamente, a covid-19 tem novamente um papel no meio desta questão.
A agência Reuters dá conta que as recentes restrições relacionadas com doenças na China “afetaram a procura do consumidor e aumentaram a inflação na segunda maior economia do mundo, resultando numa queda acentuada nas vendas de smartphones e computadores”.
Enquanto isso, a Reserva Federal norte-americana decretou dois aumentos históricos na sua taxas de juro para conter a inflação. O que, segundo a Reuters, “aumentou o risco de recessão e está a conduzir a cortes de empregos e a orçamentos apertados”.
Mas a produção de microchips começa a expandir-se. Um ponto crucial e facilmente esquecido relacionado com a crise destes componentes está relacionado com o facto de os fabricantes de automóveis não necessitarem das mais recentes e avançadas versões de microchips. Os que ajudam a moldar o design dos veículos são modelos mais antigos e menos potentes do que os que se encontram em computadores e smartphones.
Para dar resposta às necessidades dos fabricantes de automóveis, a indústria de microchips precisa de melhorar a sua capacidade de construir chips baratos e leves. De acordo com o Electronic Engineering Journal, “houve um verdadeiro boom na construção” desses componentes menos potentes recentemente.
A mesma fonte cita mesmo um novo relatório da Semi, a associação da indústria que serve os fabricantes de eletrónica. Segundo o documento, a capacidade de construir esses chips mais antigos “aumentou 6% em 2021, deverá crescer 5% em 2022 e subirá novamente 3% em 2023”.
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Mas, apesar desta tendência, tal não significa que a crise terminará em breve. Antes da pandemia, os norte-americanos costumavam comprar mais de 17 milhões de carros novos por ano. Em 2021, compraram pouco mais de 15 milhões.
A Cox Automotive, empresa parente da Kelley Blue Book, reduziu, recentemente, a sua previsão para 2022. Agora, prevê que os norte-americanos comprem apenas 14,4 milhões de carros este ano.
Mais chips não significa, necessariamente, mais carros
A produção de chips pode, de facto, recuperar. Mas tal não significa que os fabricantes de automóveis regressem aos bons velhos tempos, onde construíam tantos modelos que os stands os vendiam depois.
Os fabricantes querem evitar o excesso de automóveis e ter de baixar os preços. Alguns já fizeram saber que planeiam manter os stocks baixos indefinidamente. A Ford, um dos maiores, brincou publicamente com a situação, ao falar na mudança para um modelo de negócio em que os norte-americanos encomendam carros antes de eles serem construídos.
Grupos de concessionários também defendem que vastos stocks e grandes descontos podem nunca mais voltar. Portanto, mesmo que a oferta de chips aumente, tal pode não ser suficiente para reduzir os preços dos carros novos.
O Automotive News dá conta que os fabricantes europeus reduziram as suas metas de produção em 25 mil carros apenas no final de junho de 2022 para evitar a formação de stock. Os asiáticos seguiram o exemplo, aplicando um corte de 23 mil unidades nos seus planos semanais.
Com os fabricantes de automóveis a reduzirem os seus planos, “não há um cronograma claro para qualquer recuperação notável nos níveis de stock de novos veículos”, alerta a Cox Automotive. Com o seu economista sénior, Charlie Chesbrough, a ir mais longe: “A falta de oferta ainda é o maior óbice que a indústria automóvel enfrenta hoje”.
Essa contrariedade ajudou a levar os preços para níveis recorde, o que não é, de todo, mau para os fabricantes de automóveis. “É um mercado de vendedores”, frisa Charlie Chesbrough. E o que é facto é que os vendedores podem decidir que gostam de jogar o jogo desta forma.
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