Sabia que o sinal de trânsito mais antigo do mundo fica em Lisboa?

O stress no trânsito não é coisa moderna, nem nasceu com o advento do automóvel. Muito antes disso, quando as artérias urbanas eram cruzadas por carros de bois, carroças puxadas por mulas ou elegantes coches atrelados a esbeltos cavalos, não era incomum haver quem se aborrecesse, soltasse as rédeas e entrasse em conflito direto com quem se cruzava no seu caminho.
Era o que acontecia, amiúde, na Rua do Salvador, no bairro lisboeta de Alfama, em pleno século XVII. A estreitíssima artéria tornava-se ainda mais complicada pelo facto de um edifício sair do alinhamento do quarteirão, estrangulando uma passagem deveras importante, já que era por ela que se ligavam as portas do Castelo de São Jorge à Baixa lisboeta.
Imagine-se a cena: um cocheiro a transportar passageiros desde o Castelo de S. Jorge chegava a um ponto da Rua do Salvador e dava de frente com uma sege que trazia roupa lavada para entrega. Ao mesmo tempo, não conseguiam passar. E o mais comum é que nenhum arredasse pé, dando origem a uma escaramuça que, muitas vezes, acabava com a autoridade envolvida e, algumas vezes, com feridos e até mortos.
Os casos de querela (afinal, nos animais não se consegue engatar uma marcha-atrás, e fazer recuar os bichos era um trabalho hercúleo) foram tantos que D. Pedro II decidiu pôr termo às zaragatas, colocando aquele que é tido como o mais antigo sinal de trânsito do mundo.

Fotos de @denisgiacobelis
A placa de mármore gravada exibe bem a sua data: no arranque, lê-se “Anno de 1686”. Ou seja, tem, nada mais, nada menos que 338 anos! Nela, D. Pedro II fez jus ao seu cognome, de “o Pacífico”, e arranjou forma de apaziguar os ânimos entre quem fazia vida a comandar os animais que puxavam as carroças, de carga ou de passageiros. “Sua Majestade ordena que os coches, seges e liteiras que vierem da portaria do Salvador, recuem para a mesma parte.”
Ou seja, com a determinação real já não podia haver lugar a desentendimentos. Quem chegasse vindo de cima teria de recuar e ceder passagem a quem estava a subir – regra que, curiosamente, continua a estar prevista no Código da Estrada, no Artigo 33º: “Quando a faixa de rodagem for demasiadamente estreita ou se encontrar obstruída de ambos os lados, deve ceder a passagem o condutor do veículo que chegar depois ao troço ou, se se tratar de via de forte inclinação, o condutor do veículo que desce.”
Em 1686, a não observância da regra, que existia explícita em mais placas noutras problemáticas intersecções da capital, implicava cinco anos de degredo em terras do Brasil e multa de 2000 cruzados. Em 2024, a lei dita que “quem infringir o disposto (…) é sancionado com coima de 60 a 300 euros”.
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