Renault 4L: mais de 30 anos de serviço

Em meados do século XX, o Citroën 2CV, o VW Carocha e o Renault 4CV digladiavam-se por um lugar ao sol. Mas, entre os três, o último envelheceu mais depressa e o então presidente da Renault, Pierre Dreyfus, avaliou que a mudança teria de ser profunda.
Ele queria colocar nas estradas um automóvel moderno, mas simples, que pudesse ser vendido a baixo preço sem que características como a funcionalidade fossem desprezadas. Dreyfus pretendia, no fundo, agradar a gregos e troianos. E conseguiu.
Definidas algumas premissas, como o aproveitamento de alguma da mecânica do 4CV, o facto de ter um motor de 600 cm3, a debitar 20cv, ou o de se apresentar com tração dianteira, tornando-se o primeiro Renault a puxar à frente, a Renault 4L chegou em agosto de 1961.
À procura de um carro novo? Faça uma pesquisa no Standvirtual Novos
A “Quatrelle”
Em Portugal, usa-se o artigo feminino antes de Renault 4L numa alusão ao facto de os seus genes sempre terem sido os de uma viatura de trabalho, sendo particularmente usado na agricultura, mas também entre os vários técnicos das câmaras municipais e das juntas de freguesia, que enfrentavam terrenos acidentados sempre que se deslocavam num país onde os acessos não eram facilitados e as vias de comunicação apresentavam inúmeros problemas.
A 4L tinha a benesse de cumprir todos esses desígnios e ainda servir para passear com a família, agradando tanto a homens como a mulheres e ainda conquistando uma fatia de clientes urbanos, impressionados pela facilidade com que se conduzia e pelo facto de o seu tamanho se adaptar à cidade como peixe na água. Curiosidade: o Papa Francisco possui uma Renault 4L de 1984, que lhe foi oferecida pelo padre italiano Renzo Zocca como recompensa pelos seus esforços em criar uma igreja para os pobres.
A primeira versão da “Quatrelle” surge com um motor de 603 cm3, com arquitetura de quatro cilindros em linha e uma caixa de apenas três velocidades. Acelerava até 95 km/h e os 20 cv de potência máxima só eram atingidos às 4700 rpm. Mas o consumo era aliciante: em torno de 6 l/100 km. Outras particularidades eram a abertura do capô (de trás para a frente), a suspensão independente nas quatro rodas, com barras de torção em ambos os eixos, e também o desenho “hatchback”, menos comum por esta altura.
No interior, reinava a simplicidade almejada por Dreyfus e que permitia colocar o carro por um preço atrativo. Com espaço para sentar quatro adultos, os bancos só tinham forro na face dianteira. Atrás do volante, apenas duas informações: de velocidade e do nível do depósito de combustível. A mala arrumava a bagagem de uma família, mas, sem os assentos traseiros, o veículo podia ser transformado num “burro de carga”, com uma volumetria de quase mil litros.
Automóvel para todos
Depois do sucesso inicial, estavam lançadas as cartas para surgirem melhorias e novas versões. Não demorou mais de um ano para ser revelada a 4L Super, com 27 cv, quatro velocidades e velocidade máxima de 100 km/h.
A explorar outro mercado, foi lançada a 4L Fourgonette, com maior capacidade de carga graças a uma intervenção na parte traseira que cresceu em altura e largura, e, a piscar o olho a um público feminino, em 1965, surgiu a 4L Parisiénne, criada em parceria com a revista “Elle”, com detalhes de design que pretendiam remeter para o mundo da moda. Ao contrário das primeiras 4L, esta apresentava bancos dianteiros individuais.
Além das mudanças de estilo, em termos mecânicos a 4L beneficiou de melhorias, passando a contar com motor de 845 cm3 e 34 cv, para uma velocidade máxima de 115 km/h.
Resultado da visão de Dreyfus e do trabalho da marca: ao fim de cinco anos, tinham sido vendidas um milhão de unidades.
Artigo recomendado: Renault Austral chega em 2023 apenas em modo híbrido
GTL 4×4, versão apimentada
Com as vendas a crescerem e o interesse do público a não parecer esmorecer, a Renault pôs mãos à obra para criar aquele que seria o rival do Mehari. É que se a Citroën tinha, a partir do 2CV, criado um automóvel tão único, a Renault não poderia ficar atrás. Nasce assim, em setembro de 1970, a 4L Rodeo, com carroçaria em plástico reforçado com fibra-de-vidro, de duas portas e capota em lona.
Em 1975, à medida que a concorrência no segmento aumentava, a “Quatrelle” parece amadurecer, sobretudo com interiores mais preocupados com o conforto dos passageiros (pela primeira vez foram incluídos encostos de cabeça). E, dois anos depois, nova festa na Renault: a 4L atingiu a marca das cinco milhões de unidades comercializadas.
As versões apimentadas começam a chegar no final dos anos 80 e no início da década seguinte, quando foi decretado o fim do modelo, existiam as variantes TL, GTL e GTL 4×4. Foi este último que conquistou um lugar de destaque na distribuição de correspondência, entre a frota da polícia ou até como carro de apoio aos bombeiros, muito usado em situações florestais.
A última unidade da 4L saiu da linha de produção a 3 de agosto de 1991, com um saldo muito positivo: ao todo, ao longo de 30 anos, foram vendidas mais de oito milhões de viaturas.
Leia também: