17 outubro 2025

Nova norma Euro7 poderá afetar também os carros elétricos

Novo Tesla Model Y Standard frente

A nova norma Euro?7, aprovado no seio da União Europeia, promete transformar significativamente o panorama da mobilidade elétrica. Tradicionalmente vistos como veículos “zero emissões” a nível local, os carros elétricos passam agora a estar sujeitos a limites que abrangem emissões não relacionadas com os gases de escape, como partículas de travões e pneus. Esta mudança levanta dúvidas sobre os custos futuros, a inovação tecnológica necessária e o posicionamento dos elétricos no mercado automóvel europeu.

Euro?7: o novo paradigma para emissões automóveis

O regime Euro?7 substitui e complementa as normas anteriores (Euro?6 e similares) com regras mais abrangentes. Uma das mudanças centrais é que deixa de focar apenas nas emissões do escape: passa a regular também poluentes originados por travagem, abrasão de pneus e outras fontes mecânicas.

Essencialmente, torna-se irrelevante o tipo de propulsão (combustão ou elétrico) quando se analisa emissões «locais», porque mesmo um veículo elétrico gera partículas de desgaste. A norma reconhece isso explicitamente ao exigir que modelos elétricos também respeitem limites de partículas (por exemplo, partículas finas por abrasão) em componentes mecânicos.

Calendário de aplicação

  • O Regulamento (UE) 2024/1257, que formaliza elementos da Euro?7, entrou em vigor em maio de 2024.
  • A partir de 29 de novembro de 2026, todos os veículos novos (novas homologações) deverão cumprir os novos requisitos para automóveis e veículos ligeiros.
  • Um ano depois (novembro de 2027) entra em vigor para novas matrículas, independentemente de homologação prévia.
  • No entanto, há algumas vozes que referem ajustes ou “versões mais brandas” da norma, fruto de negociações políticas no Parlamento Europeu.

Esse calendário significa que os fabricantes têm menos tempo do que parecia para adaptar tecnologias e garantir conformidade.

Por que é que os carros elétricos também são afetados?

A noção de que veículos elétricos são completamente limpos deixou de ser suficiente para satisfazer os novos critérios. A norma Euro?7 reconhece que há emissões fora das emissões de escape:

  1. Partículas de travagem: durante a desaceleração e uso dos freios, existe desgaste de componentes que produzem partículas finas.
  2. Partículas de pneus e piso: o atrito entre pneus e estrada gera micropartículas que contribuem para a poluição.
  3. Lubrificantes, sistemas auxiliares e maquinaria interna: mesmo componentes não diretamente ligados ao motor podem gerar emissões menores, sobretudo em uso intensivo ou degradado.

Portanto, os carros elétricos não escapam: terão de incorporar soluções que minimizem esses tipos de emissão.

Para os construtores, isso implica investimentos adicionais em sistemas de travagem regenerativa mais eficientes, materiais de travões de baixo pó, pneus de baixa abrasão, revestimentos antiemissão e monitorização mais rigorosa de partículas. Alguns artigos referem que, sob certas condições, os veículos elétricos poderiam até gerar mais emissões locais do que um carro a combustão bem tratado, especialmente em cenários de uso urbano intensivo.

Além disso, a norma Euro?7 deixa de considerar os elétricos como “livres de emissões locais” de forma automática. Já não basta não ter emissões de escape, é necessário demonstrar que o veículo é “limpo” também nas componentes mecânicas.

Impactos esperados para o setor automóvel e os consumidores

1. Aumento de custos e preço final

Implementar tecnologias capazes de cumprir os novos limites trará custos adicionais aos fabricantes e esses custos tendem a ser transferidos para os compradores. Expectativa: automóveis elétricos mais caros do que hoje em dia.

2. Inovação tecnológica acelerada

Os fabricantes serão pressionados a inovar: novos materiais de travão, novos compostos de pneus, sistemas de captura ou filtragem de partículas, sensores avançados de monitorização, entre outros. Veículos com “travagem virtual” ou sistemas de travagem mais sofisticados poderão ganhar vantagem competitiva.

3. Seleção de mercado e modelos adaptados

Nem todos os modelos elétricos poderão ser facilmente adaptados. Modelos de gama baixa ou antigos podem sair de linha se não for viável adaptá-los. Isso poderá reforçar a tendência para grandes fabricantes com escala e capacidade de P&D.

4. Alterações ao posicionamento regulatório

Políticas de incentivo à mobilidade elétrica (subvenções, isenções fiscais, privilégios em zonas de baixas emissões) poderão sofrer ajustes. Se os veículos elétricos deixarem de ser vistos como “isentos” a nível local, o enquadramento regulatório poderá ser revisto.

5. Perceção do consumidor e confiança no elétrico

Para muitos compradores, a promessa de “zero emissões locais” era uma vantagem clara. A nova regra poderá gerar dúvidas ou reservas, a menos que a indústria e os legisladores comuniquem claramente os benefícios líquidos da mobilidade elétrica.

O que poderá mudar em Portugal?

Portugal possui metas ambiciosas para descarbonização e transição energética. A mobilidade elétrica é um pilar central dessas estratégias.

Incentivos existentes

No âmbito do programa Mobilidade Verde Passageiros, Portugal oferece incentivos substanciais:

  • Até 4?000?€ para particulares que adquiram veículos elétricos novos, desde que seja efetuado o abate de veículo a combustão com mais de 10 anos.
  • Bicicletas elétricas citadinas têm apoio a 50?% do valor com IVA, até um máximo de 500?€.
  • Para bicicletas de carga elétricas, o apoio pode chegar aos 1?500?€.
  • Também existem apoios para carregadores elétricos instalados em condomínios, cobrindo 80?% do custo até um teto.

Esses apoios reduzem o impacto financeiro da transição, mas não anulam as exigências técnicas impostas pela Euro?7.

Desafios para as normas em Portugal

  1. Regulação nacional e adaptações
    Portugal terá de incorporar no seu ordenamento jurídico os requisitos da norma Euro?7, adaptando procedimentos de homologação, certificação e fiscalização.
  2. Infraestruturas de teste e certificação
    Serão necessárias entidades nacionais com capacidade para testar partículas de travões, desgaste de pneus e outras emissões mecânicas, não apenas gases de escape.
  3. Diálogo com a indústria automóvel
    Concessionárias, montadoras e fornecedores de peças terão de alinhar inovações compatíveis com o mercado português e regulamentações europeias.
  4. Comunicação e transparência para o público
    Para manter a confiança do consumidor no elétrico, será vital explicar claramente por que motivo estas novas regras são introduzidas, qual o benefício ambiental real e como serão mitigados os custos.
  5. Integração com políticas de mobilidade urbana
    Em cidades com zonas de baixas emissões (ZBE), como Lisboa, o regime Euro?7 pode alterar os critérios de acesso e os privilégios concedidos atualmente aos elétricos.

Cenários e recomendações

Cenário otimista

  • A indústria consegue adaptar veículos elétricos com custo moderado, incorporando tecnologias mitigadoras de partículas.
  • Os governos mantêm incentivos e privilégios aos veículos elétricos, reforçando que o balanço ambiental (emissões ao longo do ciclo de vida) continua favorável ao elétrico.
  • O consumidor assume que o “elétrico” continua a ser uma aposta sólida, apesar das novas exigências.

Cenário de risco

  • Os custos elevados levam a aumentos de preço que tornam os elétricos menos acessíveis.
  • Alguns modelos de entrada são descontinuados por inviabilidade técnica.
  • O consumidor perde confiança e as vendas de elétricos sofrem abrandamento.

Recomendações para Portugal

  • Acelerar a formação e certificação técnica: criar competências nacionais em medições de partículas de travões e abrasão de pneus.
  • Manter e reforçar incentivos: para compensar o custo adicional imposto por novos requisitos técnicos.
  • Fomentar inovação local: incentivar P&D em materiais de baixo desgaste e sistemas regenerativos eficientes em empresas portuguesas.
  • Comunicação transparente: explicar claramente ao público o impacto e os benefícios líquidos da aplicação da norma Euro?7.
  • Monitorizar de perto os prazos e exceções: acompanhar as negociações europeias que podem suavizar exigências ou diferir prazos.

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